MPC diz que Mauá comprou 10 vezes mais luvas do que precisava e pagou 36% mais caro

Prefeitura de Mauá admite que considerou o pior cenário de pandemia na compra de luvas cirúrgicas. (Foto: Divulgação)

Para o MPC (Ministério Público de Contas) a prefeitura de Mauá superestimou a situação de pandemia da covid-19 ao comprar, em março, 12 mil caixas de luvas cirúrgicas, 10 vezes mais que o necessário, considerando o pior cenário da doença, e ainda pagou 36% mais caro considerando as cotações de preço.

O município contratou a Gott Wird Comércio e Serviços pagando R$ 624 mil pelo produto, ou R$ 52 cada caixa, quando o mesmo item foi oferecido pela Patamar Comércio de Produtos em Geral foi R$ 38,24. A prefeitura admite que considerou o pior cenário da pandemia da covid-19 para definir o volume de compras e justificou o preço na alta procura no momento da compra.

Newsletter RD

Em seu relatório assinado nesta sexta-feira (14/08) o procurador do MPC, Rafael Antonio Baldo disse que a prefeitura de Mauá considerou que 90% da população seria infectada por isso a grande aquisição de material cirúrgico. “Não somente superestimou em demasia o número de contaminações, como ainda adquiriu material em quantidades exageradas, até mesmo considerando a aludida taxa de 90% da população contaminada. Em relação ao Município de Mauá, tem-se que, até a data de 13/08/2020, a taxa de contaminação foi registrada em 0,87% da população. Ainda que se contestem tais números, em virtude da possível subnotificação dos casos de covid-19 no Brasil, é difícil acreditar que, em apenas 6 meses desde o primeiro caso formalizado, tenha se chegado ao extraordinário percentual de 90% da população contaminada. Em reportagem do dia 09/07/2020, o site El País publicou estudo realizado pela prefeitura de São Paulo por meio do qual a municipalidade estimava que o número de infectados na cidade poderia ser até 7 vezes maior do que indicavam os dados oficiais. O resultado levaria à conclusão de que 9,5% dos habitantes da Capital estariam infectados”, apontou o procurador em seu despacho.

O cálculo do MPC, feito com base nas informações da prefeitura, revela que mesmo com 90% da população infectada a prefeitura teria que comprar 1.001 caixas de luvas cirúrgicas, mas comprou 12 mil. O órgão de fiscalização considerou que o montante comprado daria para a prefeitura durante três anos.

O MPC fez um comparativo do material comprado por Mauá e por outras cidades, usando até exemplos do ABC. O valor gasto por unidade (R$ 52) ficou 62% acima do pago pelo governo do estado no mesmo período. “Ao comparar as aquisições feitas pelos municípios de Mogi das Cruzes, São Bernardo e Santo André, todos de porte semelhante, verifica-se que a diferença foi de 56% em relação ao município de Mauá”, sustentou Baldo que concluiu: “não resta qualquer dúvida de que a prefeitura de Mauá comprou uma quantidade exorbitante de luvas cirúrgicas tamanho M, em desrespeito ao inciso IV, do artigo 4°B, da Lei Federal n° 13.979/2020. A despeito da ausência de falhas na execução contratual, o Ministério Público de Contas entende que a matéria também se encontra contaminada devido aos fortes indícios probatórios de superfaturamento e de superdimensionamento dos insumos adquiridos, causando prejuízo ao erário na fase de execução contratual”.

Em uma longa nota à imprensa a prefeitura nega irregularidades e diz que ainda não recebeu nenhuma notificação. A administração municipal confirmou que a compra foi balizada na estimativa de contaminação de até 90% da população. “Com relação ao quantitativo, para cálculo da previsão média de consumo de luvas, considerou-se, por segurança diante da imprevisibilidade à época da aquisição, eventuais e futuras necessidades de consumo decorrentes dos piores cenários estabelecidos para a pandemia covid-19, caso a contaminação de 60 a 90% da população se consolidasse, em situação que poderia chegar a 431.962 casos confirmados no município”.

A prefeitura aponta ainda a necessidade do uso de vários conjuntos de luvas por paciente. “Nas ações assistenciais decorrentes da pandemia, considerando os profissionais de saúde utilizando luvas de procedimento nos atendimentos para avaliação de casos suspeitos, cada paciente passa, inicialmente, por no mínimo quatro etapas, que demandariam cada uma o uso de um par de luvas de procedimento: Triagem, Consulta médica, Coleta de exames/Medicação e Retorno em consulta médica para alta ou internação. Isso significaria, no pior cenário possível por exemplo, com 90% da população contaminada, seriam consumidas mais de 100 mil unidades de luvas de procedimento, isso somente levando-se em consideração as de tamanho M e apenas para a triagem e atendimento inicial de casos confirmados de covid-19 dos estimados 9,12% dos pacientes sintomáticos dos 431.962 contaminados que seriam internados”

Trabalhadores de outras secretarias também receberam luvas, de acordo com a explicação da prefeitura. “Ações intersetoriais foram realizadas, envolvendo o fornecimento de luvas aos trabalhadores de outras secretarias como Educação, Serviços Urbanos, Segurança Alimentar, Promoção Social, Administração e Governo, visando garantir não somente a proteção individual de biossegurança aos trabalhadores dos serviços públicos municipais, como também a proteção da população em geral, no sentido de impedir o contato direto das mãos com superfícies que pudessem oferecer risco de contaminação. Diante disto, a escolha técnica visando a prevenção da disseminação do novo coronavírus, foi a de garantir um estoque de segurança capaz de garantir a proteção de biossegurança a todos os trabalhadores, para que estes pudessem utilizar-se do item nas diversas secretarias que dele necessitam em suas rotinas de trabalho, além de suprir as necessidades relacionadas a eventuais campanhas de prevenção e ações externas relacionadas às medidas de combate da pandemia, como também garantir o funcionamento de serviços essenciais de saúde livre de riscos à previsão máxima de infectados, conforme as estimativas constantes do referido estudo, que foi prontamente apresentado ao Tribunal de Contas”. A prefeitura explicou ainda que a validade dos itens comprados é de 5 anos.

Sobre o preço pago pelas 12 mil caixas de luvas a prefeitura culpou a grande procura que influenciou o mercado nos primeiros meses da pandemia. “Com relação aos preços praticados, foram enviados pedidos de cotações de preços para 27 fornecedores no total, cumprindo-se rigorosamente os ditames da Lei Federal nº 13.979/2.020, comprovando-se a realização de pesquisa ampla com potenciais fornecedores. Saliente-se que nos primeiros meses da pandemia, a alta demanda por produtos médicos hospitalares e a dificuldade de insumos, produção, transporte e importação fez com que vários itens ficassem escassos no mercado, resultando em uma grande variação de preços. Desta forma, a aquisição de acordo com os valores apresentados no respectivo processo administrativo, foi devidamente justificada e documentada, sendo todo processo também prontamente encaminhado ao Tribunal de Contas, juntamente às Planilhas de Pesquisas de Preços elaboradas em aquisições similares por outros municípios e estados, comprovando a compatível média de preços praticados”, justifica a administração mauaense.

Receba notícias do ABC diariamente em seu telefone.
Envie a mensagem “receber” via WhatsApp para o número 11 99927-5496.

Compartilhar nas redes