O novo coronavírus colocou à prova a ordem social – situação semelhante ao que foi vivenciado há cem anos, quando a gripe espanhola colocou a inteligência humana diante do desafio de descobrir cura para a doença. Em entrevista ao RDtv, o doutor em Ciência da Religião e pesquisador do Conjuscs/USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Claudio Pereira Noronha, explica que a descoberta para a covid-19 não se restringe exclusivamente ao “campo técnico científico”, mas há um desafio sociocultural para lidar com a “nova” situação do pós pandemia.
Conforme estudo publicado pelo pesquisador, embora a morte não esteja sobre o controle da população, até meses atrás se tinha a capacidade de se organizar e possibilitar um “certo nível de prevenção” das pessoas, com particularidades devido às desigualdades socioeconômicas do país, no entanto, com o passar do tempo, a situação piorou e, principalmente, as instituições religiosas se encontraram desafiadas. “Boa parte depende da presença de pessoas (fiéis ou simpatizantes) para as cerimônias. Como fazer isso em um contexto de isolamento social?”, questiona o pesquisador.
Para além das questões de ordem espiritual – de significativa importância para grande parte das pessoas – Noronha lembra que a pandemia trouxe um conjunto de problemas do ponto de vista de comportamento, que o distanciamento social não deveria interferir. “É um momento de incertezas, de problemas emocionais que se evidenciam e ganham muita força, uma dimensão que ganha urgência de ser enfrentada independe da forma que seja, e que apesar do isolamento social, o distanciamento não pode interferir as pessoas da fé”, afirma.
Nesse mesmo compasso de evolução da doença, o pesquisador aponta que as instituições se reinventaram com cerimonias que fazem atividades via internet e assim as redes sociais passam a ganhar o seu próprio protagonismo. “De um certo modo as instituições também ganharam sua própria dimensão, se reinventaram e apesar de mostrarem o novo, também evidenciaram os problemas sociais do mundo, apontaram que eles existem e que precisam ser enfrentados”, relata.
O estudo aponta que o modelo econômico vigente no País trata o enxugamento do Estado e a retirada de direitos dos trabalhadores como fatores de “modernização”, não de atender aos problemas trazidos pela necessidade das pessoas ficar em casa para se proteger. “Isso agravou a pobreza! O Estado, num país de altíssima concentração de renda não pode negar políticas públicas que conduzam para equilibrar fatores de desigualdades. No caso de uma crise sanitária, como a covid-19, os problemas se multiplicam e o Estado precisaria agir com mais rapidez”, enfatiza”.
Segundo o pesquisador, a sociedade atual, precisa repensar os valores que orientam as decisões pessoais e coletivas – sobretudo as decisões políticas.
“Não devem ter como premissa, como hoje acontece, atender tão somente aos interesses do mercado. O que propõem é uma profunda reflexão sobre uma nova sociedade com valores humanos, voltados para a colaboração, para uma cultura de paz, em que prevaleça o respeito e a diversidade”, diz.