As situações de homofobia ou transfobia têm se tornado cada vez mais frequentes nos ambientes como trabalho, escola e a família. Desde 1994, quando a homossexualidade deixou de ser interpretada transtorno psicológico, o número de casos não aumentava tanto, é o que relata do presidente da ONG ABCD´s, Marcelo Gil. Segundo o representante, uma nova modalidade a ser estudada e combatida é o transtorno homofóbico coletivo, em que as pessoas do ambiente se voltam contra quem tem opção sexual diferente. O RDTv desta terça-feira (29/09) trouxe Marcelo Gil, Jaime Ferreira Nunes Filho, que é presidente da Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) Subseção São Bernardo, e a psicóloga Josete Villani, para debater o tema.
“Desde 2005 quando fundamos a ONG ABCD´s sempre chegaram denúncias de pessoas que trabalham em escritório, escola ou na família, sempre teve esses casos de situações vexatórias, mas de uns meses para cá aumentou muito. Um dado novo é o transtorno homofóbico coletivo e o transtorno transfóbico coletivo. É aquela situação em que sempre que acontece alguma coisa ruim, a culpa é do gay. Tem sempre uma pessoa mentora dessa perseguição. Isso leva as vítimas a pensarem em se suicidar, em não mais trabalhar”, comenta Marcelo Gil.
Para o advogado da OAB de São Bernardo as situações devem ser imediatamente denunciadas e aí surgem dificuldades como encontrar testemunhas e o medo do desemprego. A constituição federal basicamente já cuida da questão da discriminação. Esses casos só aumentam e não são divulgados. A maior dificuldade é conseguir provar porque as pessoas têm medo de perder o emprego, ou no no grupo, medo de serem excluídas”, comenta Jaime Ferreira Nunes Filho.
Josete Vilani avalia como a homofobia pode passar para um nível maior dentro de um coletivo. “A fobia é o medo exagerado, algo irracional. Quando a pessoa coloca para fora algo que é dela e se tem como alvo um gay ou transexual vai colocar nela o medo próprio. Quando isso gera para duas ou três pessoas contamina, pois é fácil colocar em conjunto algo que não consigo fazer sozinha”, analisa. Para Josete a questão religiosa é colocada também como um agravante do preconceito. “A homofobia tem como pano de fundo a questão religiosa, execram a pessoa e colocam ela à margem, e os adolescentes sofrem bullying”.
A ONG ABCD´s faz atendimento e encaminhamento de denúncias. “Vivemos um momento em que o ódio é muito exposto. No ABC um triste relato é que não temos política pública direcionada a população LGBT; tem que humanizar mais o humano, compreender que tem que amar ao próximo como a si próprio. As pessoas sentem dor, pagam contas, têm que trabalhar e se alimentar. Nesse momento de pandemia esse coletivo tem que conviver, a vítima não pode se calar, tem de colocar seus direitos. Com esse novo modelo de transtorno homofóbico coletivo, a pessoa fica sem chão, se torna amedrontada. Não tenha medo, você pode denunciar para a Ong através do 11-9.8567-5530, ou também pelo canal do instagram @ongabcd´s que vai ser encaminhado para juízo”, diz Marcelo Gil.
Segundo Jaime Nunes Filho, o importante é conseguir o máximo de testemunhas possível ou uma gravação. Existem penas e eles vão ser punidos pelo crime que estão cometendo. As OABs têm comissões que vão ajudar a buscar os caminhos e canais de denúncia. Importante fazer a denúncia, não fiquem reprimidos”.
Para o advogado o preconceito existe inclusive nas instituições que deveriam combatê-lo. “Difícil falar que não tem preconceito do outro lado, quando o ministro da educação, Milton Ribeiro, diz que o adolescente homossexual vem de famílias desajustadas. É uma pessoa que deveria estar dando exemplo, para mim família desajustada é a que expulsa alguém de casa por ter uma opção diferente. No Brasil, depois que houve a criminalização da homofobia, 92% do público LGBT relata sofrer algum tipo de violência; uma pessoa LGBT morre a cada 72 horas no Brasil”, enumera Jaime Nunes Filho.
A psicóloga reforça o argumento do preconceito nas instituições. “Até 94 o homossexualismo era visto como transtorno. Estudos mostraram que é uma forma de vivência a pessoa opta, ela é assim. Mas vivemos numa sociedade eminentemente católica e a religião segrega, é inquisidora. Infelizmente estamos num momento social político difícil onde a pessoa que deveria defender os direitos humanos é religiosa e maquia seus atos com a religião. Estamos num momento em que regredimos muito. Chegamos a um momento em que o coletivo está fornecendo armas para inflamar e todos vão agir contra aquele único”, comenta Josete.
Marcelo Gil chama a atenção para o ano eleitoral e no surgimento de candidaturas LGBT, mas argumenta que há pouca ou nenhuma representação desse público nos poderes públicos na região. O GT tem grupo de trabalho, mas onde está o gestor público gay, lésbica ou bissexual assumidamente? Porque falo no consórcio? Porque é de lá que sai o direcionamento para os prefeitos. Todo ano o consórcio celebra o dia da luta contra a homofobia, mas e o dia da transfobia, passa em branco? Como alguém atua na coordenação de política pública se não sabe o que é vivenciar, o que é saber trabalhar e viver um transtorno homofóbico coletivo? Porque não se dá oportunidade para gay que tem capacidade estudado para gerir?”, indaga o fundador da ONG ABCD’s.