De volta aos holofotes por conta de confrontos com a polícia e por causa também da campanha política em que o combate é usado como plataforma eleitoral, os pancadões não pararam na pandemia, ao contrário ficaram mais frequentes. As festas de rua que envolvem aglomerações com som alto, bebidas alcoólicas vendidas irregularmente, tráfico e consumo de drogas e corrupção de menores, além de serem consideradas contravenção de perturbação do sossego, ferem a lei do silêncio, além de impedir o acesso a vias públicas.
Quem relata são os moradores dos bairros onde ocorrem os pancadões. O enfermeiro R.R., morador do Núcleo 18 de Agosto, no Jardim Campanário, em Diadema, diz que não adianta mais reclamar, pois as ações da GCM (Guarda Civil Municipal) ou da Polícia Militar não conseguem acabar com os pancadões que acontecem todos os finais de semana, desde a noite de sexta-feira até segunda-feira pela manhã. Ele relata que bares que funcionam durante a madrugada contribuem com a aglomeração e a venda irregular de bebidas alcoólicas.
Diadema há 18 anos vigora a lei que impede o funcionamento de estabelecimentos com venda de bebidas alcoólicas entre as 23h e 6h. Há alguns critérios para obtenção de uma licença especial para funcionar. Mas R. diz que não há fiscalização. “Os bares funcionam noite toda, vendem bebidas em latas, garrafas e copos plásticos que ficam pela rua na segunda de manhã. É muita sujeira depois de um final de semana aguentando barulho”, diz.
O enfermeiro conta que chegou em casa neste sábado (17/10) por volta das 18h e a rua já estava cheia. “Eu até evito entrar pela rua do centro comunitário, porque lá a essa hora já tem aglomeração, mas o movimento grande mesmo é depois das 22h. As ruas ficam completamente fechadas. Eu mesmo entrei com processo contra a Prefeitura por danos morais, então o que adianta a gente pagar imposto para a GCM andar de Jeep Renegade, e não ter apoio nenhum aqui?”, reclama.
O RD já fez várias reportagens sobre os pancadões no Núcleo 18 de Agosto, também conhecido como Vermelhão. Nas redes sociais os encontros são abertamente divulgados com antecedência e chamados Baile do Vermelhão. Publicações no Instagram do último feriado (12/10) mostram a rua tomada, pessoas sem nenhum distanciamento social ou uso de máscaras.
A Prefeitura de Diadema admite que a cidade tem 6 pontos viciados, ou seja, onde os pancadões são frequentes. Mas a situação não é vista só no município. Mauá, São Bernardo e Santo André, além de outras cidades da região metropolitana sofrem com o problema. Na segunda-feira (12/10), feriado de Nossa Senhora Aparecida, Valdete Pereira Cavalcante, uma idosa moradora da periferia da Zona Oeste da Capital, inconformada com o barulho em frente à residência, pegou uma mangueira e jogou água no público que estava na rua, onde um rapaz puxou a mangueira e a idosa caiu e sofreu ferimentos na face e na bacia.
Na contramão
Os números têm aumentado justamente na pandemia, quando as aglomerações devem ser evitadas. Segundo a Polícia Militar, somente nas sete cidades do ABC de março até o dia 16/10 foram registradas 2.293 ocorrências classificadas como pancadão, baile funk, esquenta e perturbação do sossego. O picos de registros foram em abril, maio e julho, com 386, 393 e 362 casos respectivamente.
O comandante da PM no ABC, coronel Renato Nery Machado, avalia que houve queda deste tipo de situação logo no início da pandemia, mas com a flexibilização das atividades os bailes de rua voltaram a acontecer. “Posso te dizer de modo genérico que houve redução dos eventos no início do isolamento social. Com a flexibilização, os eventos voltaram aos poucos. No final de semana passada (dias 10, 11 e12/10), em toda região, tivemos 14 eventos. Em todos houve atuação da PM em conjunto com o poder público municipal. Estamos procurando atuar de forma antecipada. Ou seja, quando temos informações prévias, ocupamos o local para evitar a formação do evento. Quando não é possível e o evento se instala, procuramos atuar na dispersão, sempre com emprego de meios de forma escalonada, iniciando com verbalização. Pancadões são uma questão para ser resolvida com atuação conjunta entre os órgãos públicos. É preciso que se tenha uma postura rigorosa de todos. A PM e as prefeituras estão fazendo os que nos compete”, analisou.
Prefeituras
Diadema informa que atualmente são 6 pontos viciados, onde os pancadões acontecem com frequência. Uma das ações adotadas foi o investimento no Caminhão Tempestade, antiga viatura dos Bombeiros que ajuda a dispersar pancadões com jatos de água. O veículo otimizou as ações da Guarda Civil Municipal (GCM). “Devido ao emprego do Tempestade, o número de atendimentos por plantão aumentou, haja visto que as dispersões são bem mais rápidas e seguras, consequentemente, há mais tempo para realizar outras intervenções”, diz a nota sem informar quantos pancadões foram coibidos em 2020. As reclamações podem ser feitas pelo 153.
Mauá informa em nota que tem tido êxito no combate aos pancadões. “Informamos que há dois locais na cidade – rua Topázio e a rua Eucalipto – que eram pontos de encontro, mas com o monitoramento, os eventos não ocorrem mais. Foram feitas inúmeras coibições a este tipo de evento; apenas neste fim de semana e feriado (dias 10, 11 e 12/10) a GCM atendeu 22 chamadas de perturbação de sossego em residências e comércios, sendo quatro delas como intervenções de pancadões, uma no Jardim Itapark, duas no Jardim Oratório e a última no Jardim Cerqueira Leite. Foram feitas 70 orientações, sem condução ao DP e apreensão de cinco veículos”, relata a Prefeitura ao reforçar que esses eventos são proibidos e as denúncias podem ser feitas nos telefones 153 ou 4543-0354.
São Bernardo criou em maio de 2.017 a operação Noite Tranquila, comandada pela GCM e que conta com apoio da PM. “O objetivo é combater festas irregulares enquadradas como perturbação do sossego público, por meio de saturação de viaturas em bairros estratégicos, rondas, monitoramento de vias públicas com alta concentração de pessoas e bloqueios, com foco em veículos equipados com aparelhagem de som. Neste ano, já foram cerca de 100 operações para dispersão de pancadões, além de ações preventivas em regiões estratégicas. Atualmente, a cidade não conta com pontos viciados de pancadões. Munícipes podem denunciar a realização festas irregulares, por meio do número 153 da GCM, do 190 da PM e do aplicativo SBC na Palma da Mão”, detalha a administração.
A Prefeitura de Santo André contabiliza cinco regiões na cidade consideradas pontos viciados para a realização destes ‘bailes’. “A GCM atuou mais de 50 vezes nos locais neste ano; já em 2019 esse número superou 70 ações das forças policiais nestas regiões. Vale destacar que as apreensões, sejam de veículos, motos, aparelhagem de som entre outras, são realizadas pela Polícia Militar”. As denúncias também são feitas através do 153, além do 190 da Polícia Militar.
Ribeirão Pires e São Caetano informaram que não têm registro do tipo de ocorrência. Rio Grande da Serra não informou.