O hipotireoidismo primário, que pode ser causado pela poluição industrial na população moradora no entorno do Polo Petroquímico do ABC, continua no foco de pesquisas da médica Maria Angela Zaccarelli Marino, professora de Endocrinologia do Centro Universitário Saúde ABC, da Faculdade de Medicina do ABC. Maria Angela estuda há 31 anos a possível relação da doença entre os pacientes que vivem na região do Polo, situado em Santo André, Mauá e Zona Leste da Capital. Até 2021, quase 5 mil casos são monitorados e metade tem apresentado queixas da enfermidade.
Várias pesquisas já foram publicadas sobre a associação do hipotireoidismo primário e a exposição da população a ambientes industriais, um deles no periódico científico International Journal of Environmental Research and Public Health. “Os compostos orgânicos voláteis (COVs), o monóxido de carbono (CO) e o dióxido de nitrogênio (NO2) foram identificados como os principais agentes químicos, pois apresentaram as maiores correlações entre hipotireoidismo primário e concentração de poluentes”, detalha a médica, que em 1989 registrou o primeiro caso da doença em um morador que trabalhava numa das indústrias do Polo.
O levantamento de dados sobre a doença continua, e a endocrinologista diz que a equipe ampliou a pesquisa. “Já fizemos um estudo epidemiológico para que pudéssemos saber quantas pessoas estão tomando o hormônio tireoidiano e ampliamos para as doenças pulmonares, oftalmológicas, otorrinolaringológicas e dermatológicas, porque na região, além da tireoidite, as pessoas se queixam de outras doenças”, completa a endocrinologista, que concedeu entrevista nesta quarta-feira (5/5) ao canal RDtv.
Maria Angela está debruçada, também, em analisar, desde 2009, a presença de metais tóxicos em árvores no entorno do Polo. Outro estudo é sobre o risco dos pacientes com a doença contraírem a covid-19. “Estamos cuidando da saúde da população, e os poluentes nós estamos investigando nessa região, e como fizemos a pesquisa durante muito tempo, em 2002 notificamos essa doença porque já havia muitos casos na mesma região, e ela se tornou pública”, diz.
“O que nós já divulgamos tem sido importante para que as pessoas procurem o serviço de saúde, para que tomem os medicamentos necessários, e a doença não evolua ao quadro mais grave que é o coma e a morte”, comenta.
De acordo com a professora, a tireoidite crônica autoimune, que causa o hipotereoidismo primário, pode levar à morte e é uma doença inflamatória, em que a glândula produz anticorpos contra ela mesma e se auto destrói, de forma a impedir sua função e provocar o hipotireoidismo primário, que é a falta dos hormônios tireoidianos.
Maria Angela participou no início de maio da primeira audiência com a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) e vereadores sobre as reclamações dos moradores de Santo André, Mauá e Zona Leste da Capital, em relação à emissão de poluentes, qualidade do ar e substância de coloração escura que cai nas residências.
As reclamações aumentaram desde outubro de 2020, segundo Maria Angela, o que despertou mais preocupação. “As reclamações aumentaram muito, tenho recebido com muita frequência relatos de que houve piora com o ar atmosférico naquela região do Polo. Inclusive os vídeos que me mandam com o céu escuro e chama alta nas empresas”, diz.
“Não somos absolutamente contra as empresas, mas somos a favor da saúde. Para a Cetesb eu pedi que eles determinem os elementos químicos que poderiam estar na atmosfera e nos passassem através da própria Companhia Ambiental, porque temos de pegar estes dados por meio do Instituto de Química”, comenta.