Por todo o país enfermeiros vão sair às ruas nesta sexta-feira (09/09) para protestar contra a decisão monocrática do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Luis Roberto Barroso, que suspendeu a lei 14.434 que definia o piso para os profissionais de enfermagem. Barroso questionou a viabilidade econômica da lei que vai gerar um impacto de R$ 16 bilhões. O ministro, que é relator de uma adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) movida pela CNS (Confederação Nacional de Saúde), decidiu no domingo (04/09) suspender o piso. A confederação considera que o piso é insustentável. A decisão de Barroso será submetida ao plenário do STF nesta sexta-feira e as manifestações visam pressionar pela liberação do piso.
O piso estabelece salário de R$ 4.750 para enfermeiros, R$ 3.325 para técnicos de enfermagem, e de R$ 2.375 para auxiliares e parteiras. Para falar sobre a mobilização da categoria o RDTv desta quinta-feira (08/09) recebeu o presidente do CorenSP (Conselho Regional de enfermagem de São Paulo), James Francisco dos Santos.
“A nossa lei 14.434 já se encontrava em vigência desde o último dia 5 de agosto quando foi assinada pelo presidente, mas infelizmente, no último domingo acabamos tendo um revés, que não esperávamos. Nós já sabíamos da Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo Conselho Nacional de Saúde, mas não entendíamos que poderia ter essa decisão do ministro Barroso, respeitamos, mas desde já colocamos que essa foi uma decisão monocrática. Tudo que ele precisava de esclarecimentos já havia sido trazido em todas as peças que compunham da discussão da lei e também foi encaminhado pelas entidades de classe, pelo Conselho Federal de Enfermagem, explicando de onde viriam os recursos, quais eram as possíveis fontes de financiamento, que não existe nenhuma inconstitucionalidade durante a aprovação da lei. E vamos trabalhar ser derrubada essa decisão monocrática”, disse Santos.
O presidente do CorenSP disse que os profissionais de enfermagem mostraram seu valor durante a pandemia que a categoria é indispensável para o sistema de saúde. “O profissional de enfermagem foi, durante a pandemia, tratado como herói, se colocou à disposição da sociedade. A enfermagem foi a categoria que mais perdeu profissionais nos últimos dois anos, foram mais de 800 vidas ceifadas ao longo da pandemia e mais de 60 mil casos de profissionais contaminados e muitos ficaram sequelados. O mérito ninguém questiona. O questionamento é outro; de onde virão as fontes de financiamento”.
Segundo Santos, não há inconstitucionalidade na medida. “A adin é para avaliar se a lei é constitucional ou não. Não tínhamos nenhuma dúvida, os deputados e senadores tiveram todo o cuidado assim como as entidades de classe para promover o melhor na nossa lei e isso foi feito. Quando chegou na mão do ministro ele questionou a empregabilidade, de onde viriam as fontes de recursos e quais os impactos do piso salarial da enfermagem. O impacto nós já sabíamos, que é de R$ 16 bilhões valor que foi levantado pelo grupo de trabalho que foi gerenciado pelo deputado Alexandre Padilha (PT), provamos que não haveria nenhum impacto quanto a empregabilidade, baseados em dados do Dieese, e teríamos algumas fontes de financiamento como a taxação dos jogos de azar; a desoneração da folha de pagamento do setor de saúde, já que existem outros 17 segmentos que são desonerados; e a terceira fonte de financiamento seria a taxação sobre a mineração. Tudo isso foi colocado quando da discussão do projeto de lei”.
Na última terça-feira o ministro Barroso se reuniu com presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD) e foram discutidas as fontes de recursos. “A desoneração da folha, corte de outras áreas do governo com melhor disponibilidade orçamentária e o reajuste da Tabela SUS, que não é reajustada há mais de 20 anos, estão entre elas. Não é a enfermagem que vai prover fontes de financiamento, a promoção se dá através do movimento político. As fontes de financiamento são para os setores público e filantrópico, já para o setor privado, não tem necessidade, porque ele já tem dinheiro para pagar o nosso piso salarial. Uma grande rede privada disse que teve uma arrecadação de R$ 22 bilhões no ano passado. Como não pagar os profissionais ganhando R$ 22 bilhões e doando R$ 1,2 bilhões para campanhas publicitárias do período eleitoral? Não há que se questionar que não tenha dinheiro para pagar o piso, o que precisa é boa vontade e equacionar as contas para que isso seja resolvido”, critica o presidente do CorenSP.
Para James Francisco dos Santos, existe um contrassenso em relação à argumentação do ministro Barroso. “O Supremo deu um aumento de 18% nos seus salários e que, nesse efeito cascata, teria um gasto de R$ 8 milhões por ano. Se eu não posso tirar uma despesa, maior do que R$ 5 milhões para pagar o piso do profissional de enfermagem, porque gerar um déficit de R$ 8 milhões? Por isso que respeitamos a decisão do ministro, mas não concordamos porque os argumentos para essa suspensão da nossa lei são fracos”.
O presidente do CorenSP diz que as Santas Casas e hospitais filantrópicos já estão com um déficit muito grande, e ele culpa a tabela do SUS defasada. Ele também disse não ter ficado surpreso com a ação movida pela CNS. “O Padilha fez quatro audiências públicas onde em uma ele ouviu todo o setor da enfermagem, os fóruns estaduais e o fórum nacional da enfermagem, depois foi ouvido o setor privado e aí entra o CNS que disse que para pagar o piso seriam necessários R$ 40 bilhões e que se não houvesse recursos haveria fechamento de leitos e demissão em massa. A terceira audiência foi para ouvir o Ministério da Saúde, o ministério da Economia e todos os agentes do governo. Após essas audiências foi feito e aprovado um relatório. A CNS colocou que seriam necessários R$ 40 bilhões e foi provado que são R$ 16 bilhões, questionavam o fechamento de leitos que até hoje não houve nenhum, questionavam processo de demissão em massa, e isso foi colocado como forma de pressão psicológica para os profissionais de enfermagem, é mais fácil demitir do que ajustar”, critica Santos.
A enfermagem emprega 2,6 milhões de trabalhadores no país e 693 mil destes empregos estão no Estado de São Paulo que responde por 25% do total de profissionais do país. “Se reduzir não há o que se falar em qualidade ou em benfeitoria em prol do paciente. O subdimencionamento de profissionais de enfermagem será prejudicial para todos, sem a enfermagem não existe saúde no Brasil”, destaca James Francisco dos Santos.
Mobilização
Desde quarta-feira (07/09) as entidades da saúde e principalmente da enfermagem começaram uma mobilização contra a decisão de atos que vão acontecer em todos os estados nesta sexta-feira (09/09). Em São Paulo, às 9h, os profissionais vão sair da sede do CorenSP na Alameda Ribeirão Preto, 82 , na Capital, em direção à avenida Paulista onde acontece um ato no vão livre do Masp. Outros atos devem acontecer em diversas partes do Estado. “Sabemos que não dá para deixar os pacientes desassistidos, mas nós convocamos todos que estejam de folga ,que possam comparecer. Neste momento o que vale é a mobilização de todos os profissionais e a demonstração de repúdio. Pedimos que venham de roupa preta e jaleco branco para que possamos mostrar o poder que a enfermagem tem”, concluiu o presidente do CorenSP.