O Dia Nacional de Conscientização sobre o Autismo acontece neste dia 2 de abril. A data existe desde 2007 e tem o objetivo de difundir informações sobre o Transtorno do Espectro Autista, também conhecido como TEA. Sem dúvida um dos desafios, tanto para as crianças, como para os pais e os educadores, é garantir uma educação inclusiva. Para especialistas no tema ‘educação inclusiva’, ouvidas pelo RD, o maior investimento que a educação pública deve ter é na capacitação dos profissionais da educação. Todo o acesso do estudante é garantido por leis, mesmo assim a educação municipal, estadual e até particular têm falhas.
O NEAFMABC (Núcleo Especializado em Aprendizagem da Faculdade de Medicina do ABC) Interdisciplinar estuda o tema e para a coordenadora Alessandra Caturani Wajnsztejn, a pandemia contribuiu negativamente para a educação de crianças com TEA. “O desafio é existente, não somente para o atendimento educacional dos alunos dentro do espectro autista, mas quanto a todos os transtornos do neurodesenvolvimento e na realidade de toda a educação brasileira, principalmente após o impacto que a pandemia casou no sistema de ensino”, aponta.
Para a neuropsicopedagoga Ketlyn Gil Garcia, também membro do NEAFMABC, o plano educacional deve ter um link com a área da saúde. “Compreender e acolher a demanda acadêmica do aluno com espectro requer atenção significativa quanto a investimentos na formação e capacitação do educador, dos gestores, de todos os profissionais da educação, e de profissionais que façam a intersetorialidade entre educação e saúde. Isso é um desafio a todos os municípios do país”, diz.
Monitor
O monitor para auxiliar é fundamental e necessário aos estudantes autistas, que precisam desse apoio, por isso que o plano educacional é individualizado. “Cada aluno dentro do espectro, tem suas particularidades pedagógicas que requerem planejamento específico na ação educacional. Nem todo aluno dentro do espectro necessita de um acompanhante terapêutico, que tem a função de auxiliar seu desenvolvimento educacional, cognitivo e social dentro do ambiente escolar”, diz Ketlyn Gil Garcia.
Segundo a neuropsicopedagoga e a coordenadora do NEAFMABC, a escola deve oferecer o atendimento especializado previsto na LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei nº9394/96). “O município precisa seguir as diretrizes da educação nacional básica, e da educação especial para esse atendimento. Além de legislação específica do Transtorno do Espectro Autista, a Lei Berenice (nº 12.764/12), a Lei Brasileira de Inclusão – LBI (nº 13.146/15) que asseguram que pessoas com o transtorno, que é considerado uma deficiência, tenham acesso a um sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida”, afirma.
Alessandra Wajnsztejn diz ainda que a pandemia da covid-19, que agravou problemas sociais, econômicos e atingiu também a educação, trouxe a necessidade de ações intersetoriais. “Quando pensamos nos desafios que já cercavam a realidade do ensino brasileiro e agora e um pós-pandemia com o impacto que o ensino sofreu, nos deparamos com a necessidade de uma maior e efetiva intersecção de investimentos, diálogo entre toda sociedade, visto que o ensino, a saúde mental e a realidade socioeconômica estão em plena necessidade de serem acolhidas em ações conjuntas. A educação como um todo e para todos é a bússola que nos levará a diminuir a desigualdade e promover a inclusão com equidade, e assim crescendo todos numa sociedade com mais oportunidades”, conclui a coordenadora do Núcleo de avaliação interdisciplinar.
Grupo
Para as mães de crianças autistas é sempre muito difícil conseguir o acesso à educação, muitas levam muitos nãos ao tentarem fazer as matrículas e há quem omita a informação para, ao menos, conseguir que o filho ingresse na escola. “A maior barreira é a falta de conhecimento sobre o autismo, os professores não sabem o que é o transtorno do espectro autista. A segunda barreira é a fuga do Estado”, diz a advogada Luana Eloá, mãe de Luan de 13 anos que tem TEA. Ela é fundadora da ONG Teacolher, que reúne 600 famílias de crianças autistas no ABC.
Segundo Luana, as escolas municipais são as menos piores, já as do Estado, que assumem as crianças a partir do Fundamental II, não estão nada preparadas. “Eu já fiz oito denúncias este ano na Diretoria de Ensino de Diadema por causa de atendimento. São queixas que vão desde a falta de alimentação adaptada até a falta de conhecimento sobre a situação do aluno. Então analisando as duas redes a municipal é a menos pior e a do Estado é um caos total”, diz a advogada que diz já ter judicializado inúmeras situações. “Tem criança que precisa de um cuidador, que não entra na sala de aula e auxilia em questões como a da higiene, outros precisam de um professor especial. Se o Estado não fornece a solução é ir à Justiça, mas quem não pode pagar um advogado vai ficar na fila da Defensoria Pública, mas uma mãe que precisa cuidar do filho o tempo todo não tem tempo para essa fila”, diz.
Mesmo quem pode pagar uma escola particular enfrenta grandes dificuldades. “No meu caso sempre encontramos rejeição. É um passeio que ele é proibido de fazer, ou uma atividade de lazer. Por isso que tem muita mãe que esconde que o filho é autista, na hora da matrícula, mas depois quando a escola percebe acaba ficando pior. Nós do Teacolher orientamos a sempre falar”, explica Luana Eloá. O Teacolher vai realizar no domingo, em São Bernardo, o Autista Day, evento para o qual se espera um público de aproximadamente 3 mil pessoas. “Essa é uma luta minha de mais de cinco anos e agora vamos realizar”, completa a advogada. Informações sobre o grupo podem ser obtidas nas redes sociais @luanaeloa.sbc e @teacolherbrasil.
Diagnóstico
O RDTv desta quarta-feira (29/03) recebeu a assistente social Fátima Rebouças, especialista em educação inclusiva em deficiência intelectual, que também falou sobre os desafios para a educação de crianças com TEA. Ela destacou a importância do diagnóstico o mais cedo possível e o acompanhamento desta criança e da sua família para um desenvolvimento melhor.
“Um diagnóstico feito corretamente e no tempo correto, no tempo devido das fases de desenvolvimento, é um divisor de águas. Temos um problema muito sério com a identificação de sinais. A partir de um ano e meio já é possível perceber alguns sinais do transtorno do espectro autista, como dificuldade de interação com outras crianças, dificuldade de focar a visão ou um hiperfoco com determinado brinquedo. Ma o diagnóstico só é fechado a partir dos três anos. Se começa uma investigação, de uma dificuldade na fase do desenvolvimento, que pode ser próprio da criança ou não. E à partir dos três anos é que se vai fechar um diagnóstico, mas aí a família já está sendo atendida e aí pode-se melhorar o desenvolvimento e o desempenho dessa criança”, explica a assistente social.
Para Fátima as escolas enfrentam alguma dificuldade para o atendimento dos alunos autistas, mas elas não podem negar o atendimento. “Tem que matricular os filhos sim, não aceitar questões como a que não tem vaga, que já tem outras crianças na mesma condição na sala ou dizer que não tem o profissional preparado. Tem que se preparar. As escolas estão começando a entender o que é esse aluno que está chegando. Vamos nos organizar para atender a todos”, afirma.
A assistente social diz que faltam políticas públicas. Avaliação neuropsiquiatra é muito cara para uma família assalariada e não há acesso pela rede pública. “O pediatra tem que atender uma criança a cada dez minutos porque o sistema é muito lotado, então não tem tempo para fazer uma consulta de observação adequada. Aí cai na escola que vai dizer que a criança é teimosa, é isso, é aquilo e vai se passando o tempo e temos hoje pessoas adultas sendo diagnosticadas com espectro autista agora”, conta Fátima.