ABC - domingo , 19 de maio de 2024

IPH/USCS denuncia que estações elevatórias de esgoto não funcionam

Habitações em áreas de mananciais, com esgoto lançado a céu aberto (Foto: Divulgação TCE)

O Marco do Saneamento, que é baseado em uma lei federal aprovada em 2020, reza que os municípios devem ter 99% da população abastecida com água tratada e 90% dela com coleta e tratamento de esgotos. Três empresas operam o sistema na região e garantem atender os requisitos legais, porém a bióloga, ambientalista e coordenadora do IPH/USCS (Índice de Poluentes Hídricos da Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Marta Marcondes, denuncia que estações elevatórias, encarregadas de mandar o esgoto até a ETE (Estação de Tratamento de Esgotos) do ABC, não funcionam e há esgoto sem tratamento sendo despejado na represa Billings.

No ABC, a distribuição está focada em três empresas, a Sabesp, estatal que distribui água, coleta e trata esgotos em cinco cidades e apenas distribui para Mauá; a BRK que coleta e trata esgotos nesta mesma cidade; e o Saesa (Sistema de Água, Esgoto e Saneamento Ambiental) que distribui, coleta e trata resíduos em São Caetano e é ligada à Prefeitura.

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A Sabesp, que atua integralmente em cinco cidades, diz que os contratos estão adequados às metas de universalização previstas no Marco Legal do Saneamento e atingirão as marcas no prazo previsto. Em Diadema, segundo a estatal, a cobertura com a distribuição de água está em 99% e 95% com a coleta do esgoto, já o tratamento do esgoto está em 82%.

Investimentos

A Sabesp afirma ter investido R$ 90 milhões entre 2020 e 2022 no sistema. Em Mauá, onde a estatal responde só pela distribuição de água, ela está em 88%. A companhia informa que investiu, em 2021 e 2022, R$ 37 milhões na distribuição de água no município. Em Ribeirão Pires, o abastecimento de água está em 98% e a coleta do resíduo em 90%, porém só 79% é tratado. O investimento nos dois anos anteriores foi de R$ 38 milhões, segundo a Sabesp. Em Rio Grande da Serra, o abastecimento chega a 99%, a coleta em 78% e o tratamento é de 84%. A empresa afirma ter investido R$ 27 milhões na cidade nos dois anos anteriores.

Santo André tem os melhores índices, mas ainda não alcança toda a determinação prevista no marco. A cidade é abastecida em 99% e a coleta de esgoto está presente em 100% das casas, porém o tratamento desse esgoto está em apenas 76%. A estatal de água diz que gastou R$ 170 milhões em obras no sistema da cidade.

São Bernardo tem 99% das casas servidas com água tratada e 93% delas tem coleta de esgoto, mas o tratamento dos dejetos é de apenas 59%. Apesar do índice menor de distribuição, coleta e tratamento, a Sabesp relata haver o maior investimento da região no saneamento na cidade. Foram R$ 604,8 milhões só em 2021 e 2022.

Em São Caetano, única cidade que tem a própria empresa de saneamento, também é a única que já cumpre integralmente as metas do marco e não é de hoje. Segundo o Saesa, há 14 anos, o município está de acordo com a regra vigente. “São Caetano atingiu a marca de 100% de esgoto coletado e tratado no ano de 2009, sendo a primeira cidade da região metropolitana a conquistar essa meta. Com relação ao sistema de abastecimento e distribuição de água, São Caetano atende 100% da população com água potável, por meio dos reservatórios: Nova Gerty, Santa Maria e Oswaldo Cruz”, informa a autarquia, que, no entanto, não informa os investimentos feitos na cidade nos dois últimos anos.

Falha

Marta Marcondes é coordenadora do IPH/USCS. (Foto: Reprodução RDTv)

Para a coordenadora do IPH/USCS, a prática diverge dos números apresentados pelas empresas de saneamento. O não funcionamento de estações elevatórias, que são as responsáveis por bombear o esgoto até a ETE-ABC, é o principal problema, outro é que muitas casas ainda não estão conectadas à tubulação de coleta de esgoto que acaba sendo lançado na Billings, que abastece a maior parte da região, sem qualquer tratamento.

“O que tem no contrato é uma coisa, o que na realidade é feito, infelizmente, é outra, porque quando a gente fala de universalização do saneamento é que todos tenham acesso água, esgotamento sanitário, e uma gestão de resíduos com uma coleta onde os resíduos acabem chegando a um aterro sanitário e que cumpra nossa política nacional de resíduos sólidos. A drenagem urbana é outra coisa que nós deveríamos nos preocupar também”, adverte Marta Marcondes.

Elevatórias paradas

Para a professora da USCS, falta a parte fundamental do sistema de coleta de esgotos funcionar. “As empresas têm de fazer a captação de água, o tratamento e a distribuição e eles têm de pegar o esgoto nas três fases que são coleta, afastamento e tratamento. Nós sabemos muito bem que em alguns municípios do ABC as elevatórias, que levam para a estação de tratamento de esgoto, estão paradas, não funcionam então pode até estar escrito no contrato, mas não é isso que acontece”, reclama.

De acordo com Marta, os piores índices estão nas regiões que margeiam a Billings, nas áreas de mananciais, as produtoras de água. Nestes locais as empresas instalam cavaletes para distribuir água, mas não instalam o sistema de coleta de esgoto na mesma medida e o resultado é esgoto na água que abastece a população.

“A gente vê o esgoto sem tratamento cair direto e sem tratamento na Billings. Foi até um questionamento que a gente fez no Comitê da Bacia do Alto Tietê essa questão de ter um cavalete com água na casa da pessoa e o esgoto que essa pessoa gera não ser tratado. O argumento é que essas pessoas que vivem na margem do reservatório não deveriam morar lá. E aí a gente entra em outro problema, a habitação. Eu vejo isso toda a semana no reservatório, o esgoto indo direto sem tratamento para a represa porque até existem as estações elevatórias, mas elas não estão funcionando. É o caso do córrego Grota Funda, em Diadema, onde a estação elevatória e a caixa de contenção não funcionam. Isso a gente tem de começar a pegar no pé para que essas coisas sejam efetivadas”, destaca a bióloga.

Privatização

Para Marta Marcondes, a privatização da Sabesp, que o governo do Estado pretende fazer, será prejudicial para o saneamento. “Eu não vejo a privatização da Sabesp como algo que vai garantir isso. Tenho respeito grande pela companhia e pelos técnicos que estão lá, e privatizar a Sabesp é a pior coisa que pode acontecer para nós aqui em São Paulo. Enquanto é uma companhia do Estado a gente pode cobrar, mas isso estando na mão de uma empresa privada,  você acha que o pessoal vai gastar dinheiro com as áreas que estão mais comprometidas? Não vai”, afirma a pesquisadora.

São Caetano

Segundo a bióloga, mesmo sendo um município 100% adequado ao Marco do Saneamento, ainda há problemas em São Caetano. “A cidade tem um privilégio de ser um município pequeno e com condições de mapear toda a rede de esgoto e é mais fácil para a cidade colocar nas elevatórias que na cidade funcionam e levar para a ETE ABC. O percurso é menor, o gasto é menor, mas infelizmente a gente ainda tem problemas em algumas áreas onde se tem aquelas manilhas antigas de esgoto e é necessária uma modernização nessa rede. Mesmo assim São Caetano consegue coletar, afastar e mandar para a ETE, mas não consegue tratar os 100% do esgoto, trata talvez 90% ou 95% até por vazamentos e ligações clandestinas. Espero que São Caetano não venda o Saesa para a Sabesp e espero que continue como uma companhia de saneamento que trabalha muito bem”, completa a especialista.

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